domingo, 27 de janeiro de 2008

HERÓI.

Poesia em estado puro, o filme de Zhang Yimou é um desbunde não só para os sentidos, mas para o coração.



Com: Jet Li Lianjie, Tony Leung Chiu-wai, Maggie Cheung Man-yuk, Zhang Ziyi, Chen Daoming, Donnie Yen Ji-dan, Liu Zhongyuan, Zheng Tianyong, Qin Yan, Chang Xiaoyang. Diretor: Zhang Yimou China, 2002 – 98 min.

Trailer:

http://www.youtube.com/watch?v=xehvuJy26IA&feature=related

Cotação: 10

Herói é o primeiro filme épico feito pelo diretor chinês Zhang Yimou e uma poesia cinematográfica de uma hora e quarenta minutos. Poucas vezes me senti tão fascinado e satisfeito após sair de uma sala de cinema. Chega a ser difícil falar sobre herói porque o filme é, sem exageros, PERFEITO.

Partindo de uma premissa simples que tem como influência direta o filme Rashomon, do mestre Akira Kurosawa, Herói conta várias versões de uma mesma história. Na China antiga, no período dos Estados Guerreiros (475-221 A.C.) e antes do surgimento do primeiro imperador, a nação se dividia em sete reinos. O rei de Qin, o mais forte dos reinos, quer unificar os sete territórios, e por isso sofre constantes tentativas de assassinato. O que mais o preocupa são três assassinos de elite contratados pelos opositores de Qin. Um dia, um dos xerifes do seu reino entra em seu castelo e afirma ter derrotado sozinho os três assassinos mais temidos nos reinos. Como prova, ele traz as armas dos adversários derrotados.

Como filme de gênero do tipo Wuxia Pian (filmes de espadachins chineses), o longa tem seqüências de ação maravilhosas que ensinam aos mais impressionáveis (e aqui vai uma alfinetada direta aos fãs de Star Wars que se impressionaram com a luta de espadas no episódio 3) como é que se luta de verdade. De tão bem feitas e coreografadas, elas parecem mais um balé com espadas que uma luta.

A trilha sonora conta com um violino inspirado do veterano Itzak Perlman e é belíssima, assim como o resto do filme, o que só faz com que o espectador mergulhe ainda mais na trama.

Pena que por ser um épico que arrebatou as bilheterias dos cinemas americanos, as pessoas pensam logo que o filme TEM QUE TER ação durante toda a projeção num ritmo frenético, humor imbecil a la comédias americanas idiotas, efeitos especiais, adrenalina e explosões. Talvez isso aconteça porque já tenhamos sido (em quase maioria) domesticados a gostar desse tipo de coisa, que os que ditam a ‘moda’ dizem que é cool, enquanto filmes como Herói são tidos como coisa de Nerd. Puro preconceito de gente imbecil que se julga melhor que os outros, quando o que acontece é o contrário.


Se você ficar curioso pra ver o filme, tenha uma coisa em mente: Herói é um filme oriental. Cada frame é pra ser apreciado como uma obra de arte, um quadro de Picasso. Os silêncios estão ali para serem ouvidos e sentidos, por serem parte vital da história, não um motivo de distração e abstração pra você papear com a pessoa ao lado, mexer no celular, na bolsa...

E a ação de que falei há pouco ainda é reforçada pela absurdamente linda fotografia de Christopher Doyle, colaborador de Yimou, que é um desbunde para os sentidos. De tão bela a fotografia, chega a ser difícil de acreditar que existam lugares tão bonitos na face da terra. Destaque para a cena entre Neve Voadora e Lua, na qual todo o bosque fica vermelho e para a cena no lago, que é emocionante de linda.

As cores são um espetáculo à parte e variam de acordo com a versão da história. O vermelho significa paixão e traição; o verde, juventude; o azul, amor; o branco, a verdade, e o preto, luto. Mas apesar de ser um filme de ação, não é esta que está em voga, mas sim o elemento humano. A ação é apenas um pano de fundo para se contar uma história de revolução, amor, ideais e sacrifícios em prol de um bem maior. Além disso, o filme é de uma sensibilidade ímpar a começar pelo nome dos personagens: Céu, Espada Quebrada e Neve Voadora.

Na verdade, como poderia um filme com personagens com esses nomes ser menos que uma poesia? De todos os personagens, o que mais me cativou foi o de Tony Leung, Espada Quebrada. Dono de uma visão singular da vida e do mundo, ele chega ao ponto de abandonar uma luta para limpar uma gota d’água que cai no rosto de sua amada. A bela Maggie Cheung também está muito bem como a ressentida Neve Voadora. Zhang Ziyi, estrela de O Tigre e o Dragão e colaboradora antiga de Yimou, tem uma pequena, porém importante participação no longa como Lua, pupila de Espada Quebrada. Mas apesar de todo o elenco ser bom e de Tony Leung roubar a cena, destaco a atuação de Jet Li como o xerife Sem Nome como uma ótima e inesperada surpresa.

Quem está acostumado com os filmes que Jet Li faz nos “States” e viu Herói também deve ter se surpreendido com a sua atuação. Não me refiro às lutas, porque ele é um senhor lutador, mas à composição do personagem. Não que achasse ele um mau ator (até porque Jet nunca teve nos EUA um papel bom o suficiente para mostrar se sabe ou não atuar), pois ele é até razoável nos fracos papéis que pega na terra do tio Sam, mas quem conseguiu fazer com que ele tivesse o ótimo desempenho que tem nesse longa merece um prêmio. Minhas dúvidas em relação à sua performance dramática desapareceram por completo depois de Herói, embora saiba que ele dificilmente terá a oportunidade de mostrar esse talento nos EUA.



E para aqueles que se irritam ao ver personagens de filmes chineses voando, digo logo: em Herói eles voam, e voam muito, mas não por algum tipo de superioridade ganha através de superpoderes, e, sim, por poesia. No universo do filme aquilo é possível a qualquer um, e não a uma minoria de escolhidos ou agraciados por deuses ou entidades extraterrenas.

Além disso, eu pergunto: por que ver um chinês voando enquanto luta é tão estranho e ver um palhaço vestido de aranha escalando paredes e soltando teias pelos pulsos, ou ainda ver outro palhaço que veio de outro planeta vestindo uma sunga vermelha por cima de uma calça voando é tão normal? Muito simples: “Quando nascemos fomos programados a receber o que vocês nos empurraram com os enlatados dos USA, de 9 às 18...”



Herói é, antes de tudo, uma obra de arte. E como toda obra de arte que se preze, requer um certo grau de sensibilidade e comprometimento de quem a estiver assistindo. E pensar que se não fosse por Quentin Tarantino, provavelmente o filme nem chegaria ao ocidente...

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O filme foi distribuído no Brasil pela Miramax e pode ser facilmente achado em qualquer locadora.

5 comentários:

Tales de Azevedo disse...

Muito bom o post... realmente fiquei impressionado em ver vc falar bem de um filme do Jet Li... pessoalmente não gosto dos filmes que ele faz seja no lado oriental ou ocidental do mundo... Enfim... vou procurar saber mais sobre esse filme

Tales de Azevedo disse...

ah... a única coisa que estragou o post foi no momento em que vc falou mal do Homem Aranha aaaarrrgghhh palhaço... veja só, essa juventude de hoje em dia...

Tales de Azevedo disse...

depois desse carnaval o meu blog ficou um tanto mais parecido com o seu hehehe

Unknown disse...

Muito legal o blog.
Gostei dos comentários, mostra que está não só inteirado com o filme e que não só tenha visto o filme, como sentido a verdadeira essência do filme, e que, por sinal, é a intenção de todos os diretores. Realmente, os comentários me instigaram a assistir o filme, principalmente a mim, que gosto de filmes que desafiam a superioridade pré-definida do cinema americano e que muitas vezes produz filmes tão medíocres, mas que há de se dizer que faz filmes bons também.
O visual do filme parece ser de arrepiar e de impressionar qualquer um que veja o filme. Belas imagens você separou para apresentar o filme.
Parabéns! Excelente comentário e blog!

Abraços

Anônimo disse...

eu achei perfeito o comentário feito pelo blog,eu pode ver o filme e realmente acho que as palavras que foram utilizadas para retratar,são mais do que claras.